"As coisas em geral não são tão fáceis de apreender e dizer como normalmente nos querem levar a acreditar; a maioria dos acontecimentos é indizível, realiza-se em um espaço que nunca uma palavra penetrou" (Rilke)
quinta-feira, 7 de agosto de 2014
"Somos pássaro novo longe do ninho"
Quando estamos longe de casa nos damos conta de como nos habituamos com certas situações, e como elas nos dão uma sensação, muito boa, de conforto e segurança. Eu sou um paradoxo ambulante: ao mesmo tempo em que gosto viajar, gosto, mais ainda, de voltar para minha casa, para minha cama e para o meu cheiro, ou seja, já tinha muito claro que, definitivamente, eu não nasci para viver em hotel; a ausência de uma cozinha e a rotina de café da manhã, troca de roupas, chaves na recepção e sorrisos falsos de bom dia, boa tarde, boa noite me irritam. Mas, o que eu, ainda, não sabia era a inesquecível e inexplicável experiência de dividir apartamento com mil pessoas aleatórias! Ok, não são mil pessoas, o apartamento que eu estou morando atualmente só tem SEIS quartos e capacidade para receber OITO pessoas simultaneamente - já que dois quartos possuem cama de casal. Hoje eu não vivo num lar, vivo numa casa no sentido mais puro da palavra. Durante o semestre letivo, talvez ela se torne um pouco um lar, já que seus moradores são fixos e compartilham uma rotina e momentos de sociabilidade. Mas, como estamos nas férias, os moradores são flutuantes e incertos. Desde que eu cheguei já vi seis pessoas diferentes chegarem e partirem, e sequer soube seus nomes, eles foram apenas rostos que se cruzavam rapidamente em áreas comuns, para logo se isolarem em seus quartos e viverem em seus universos particulares. Inicialmente, eu estranhei muito esse comportamento, mas hoje, confesso que fico feliz quando isso acontece, afinal a minha individualidade e o meu espaço também são preservados, sobretudo depois que tentaram entrar em meu quarto, imaginando que estava vazio, para mexer em minhas coisas... Ou ainda, a indescritível sensação de acordar e encontrar a cozinha imunda e cheia de louça suja na pia, ou então, não encontrar garfo em nenhuma das gavetas ou escorredor, porque todos estão sujos dentro de um dos quartos. Também tem a questão dos distintos hábitos individuais, ok que isso cheira a Antropologia e merece uma interpretação mais apurada, mas dane-se o altruísmo quando inventam de ouvir música alta, lavar roupa, discutir relação por skype e cozinhar entre as 11 da noite e as 4 da manhã! No entanto, estaria sendo extremamente injusta se não pontuasse os fatores positivos dessa experiência, também há pessoas doces e simpáticas com as quais consegui estabelecer algo muito próximo de uma amizade, uma delas só passou um final de semana, mas a outra continua aqui, e permanecerá mesmo depois que eu for embora (ela já está morando em seu quarto há mais de cinco anos), também devo reconhecer o cuidado da dona (sobretudo depois do episódio do relato da tentativa de entrar nos quartos) que vem várias vezes por semana ver se estamos todos bem e se estamos precisando de alguma coisa. Aos poucos estou me acostumando com tudo isso, mas conto os dias para novamente viver em um lar (mesmo que ainda não seja o MEU lar).
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